Casa Gucci trata de uma história real, a qual boa parte do público conhece o desfecho, o que orienta o foco narrativo para a jornada dos personagens, seus motivos, suas circunstâncias, suas dificuldades. Patrizia Reggiani, Signora Gucci (interpretada por Lady Gaga) está no centro da trama, e traços de sua personalidade são desvelados progressivamente durante os 2h38 de projeção. Uma boa atuação tende a ser beneficiada pelo diretor de fotografia (Dariusz Wolski, fugindo do óbvio e entregando belos planos) e pelo montador (Claire Simpson, que imprime ritmo sem cansar o espectador), e é exatamente o que acontece. O alcance de Gaga como atriz assemelha-se ao seu alcance vocal: versátil, prazeroso, amplo. Ela consegue entregar gravidade, desespero, luto, e por outro lado, alegria, deslumbre, e firmeza na persuasão autoconfiante. O sotaque italiano nos diálogos em inglês se mostra homogêneo, somado a um trabalho vocal que cria distância da dicção normal da artista. Adam Driver dá vida a Maurizio Gucci, par de Patrizia, e a química é simplesmente perfeita: na alegria ou na tristeza, o casal é brilhantemente convincente. Quando o elenco coadjuvante está afinado, o resultado de obra cinematográfica é ainda melhor. Rodolfo Gucci, pai de Maurizio, é um personagem cativante (interpretado por Jeremy Irons, que entrega uma atuação cheia de sutilezas e muita elegância). Aldo Gucci (Al Pacino) e Paolo Gucci (Jared Leto) trazem a caracterização do temperamento toscano, expansiva, com emoções em tonalidades fortes. Cenas mais delicadas ou de maior impacto dramático recebem um tratamento econômico, elípitico, ponto forte da narrativa, e para a atmosfera geral da história. Um dos temas mais fortes do filme é o senso de propriedade, isto é, ‘o que me pertence’ e quais suas consequencias’. O filme se beneficia do ponto de vista feminino, materializado na autora do livro (Sara Gay Forden) que deu origem ao roteiro, e na própria roteirista principal, também uma mulher (Becky Johnston, que também escreveu o excelente Príncipe das Marés). Em papéis menores, temos ainda a presença de Selma Hayek, que representa uma vidente sem desbancar para o estereótipo, e o charmoso Reeve Carney (que fez Dorian Gray na série Penny Dreadful), encarnando o estilista Tom Ford, que ressuscitou criativamente a marca Gucci nos anos 90. A ambientação se dá por cenários de luxo, entre casas e restaurantes, e músicas icônicas presentes na trilha sonora, que conta com faixas de artistas como Blondie, George Michael e Donna Summer, e muito do cancioneiro italiano. O filme Casa Gucci traz ainda diversos momentos de humor, e cenas deslumbrantes, como os dois desfiles encenados (detalhe que um deles é da Versace!). O filme, dirigido pelo prolífico Ridley Scott, será forte candidato na temporada de premiações, especialmente em Figurino e Melhor Atriz (Lady Gaga).
Estreia no Brasil dia 25/11/2021. Distribuído pela Universal Pictures.